Os desafios da família na pandemia: da gravidez à construção da dinâmica familiar, live excelente com a psicoterapeuta Carla Suzarte
Psicoterapeuta há mais de 35 anos, oriunda de uma família de 10 filhos, apaixonada pela investigação do comportamento e das relações humanas, Carla Suzarte iniciou sua carreira clínica com um projeto chamado ENGRAVIDANDO. Sempre encantada com o fenômeno gravidez e conhecendo as etapas difíceis dessa grande fase da vida, decidiu que um dos focos do seu trabalho seria acompanhar os casais que queriam engravidar. Esse caminho naturalmente a levou a atuar na construção da família, e hoje seu grande projeto chama-se COMUNICAÇÃO SAGRADA, que trabalha a comunicação dentro do sistema familiar.
Nossa live começou de forma muito bem humorada, com a palestrante esclarecendo que relacionamento é desafio, principalmente para o casal. E para os casais com filhos, o aprendizado vai à potência máxima.
A gravidez é o grande momento de inauguração da família e o casal tem o direito de se preparar, para que ambos se conheçam grávidos, sabendo que essa fase vai mobilizar muito das suas próprias experiências.
Quando a gente pensa em ter um filhos, é preciso que o casal entenda que haverá uma mudança grande e permanente. É como se mudar para um novo país, sem volta. E é necessário aprender a nova linguagem e os novos costumes deste novo "país dos pais".
A gravidez é um momento de "crise" , mas de muita profundidade. É uma luminosidade tão grande quando você "dá a luz" que tudo isso confunde a cabeça, pois aconteceu a inauguração da família, mas os pais precisarão dar conta de todos os detalhes práticos, psicológicos, emocionais e de relacionamento a partir de então e, infelizmente, muitas famílias não se preocupam com isso.
Continua, explicando que "ainda hoje, não damos à gravidez a devida atenção que merece - é uma fase muito importante para um casal, na construção de uma família". Por mais que os homens atuais sejam bem mais participativos, é necessário um suporte por conta dos diversos enfrentamentos que virão com a chegada de um filho.
Para a saúde da futura família, é de extrema importância dar espaço, ouvir o casal grávido, descobrir como se apoiam e qual o lugar de cada um nessa caminhada. Não importa se vai ter gravidez física, se vão adotar, se são dois homens ou duas mulheres - o processo de construção da família é coisa muito séria. Precisamos desenvolver a consciência de que a família é basicamente para os filhos e que se deve manter essa estrutura mesmo que mais tarde a mãe /o pai concluam que não querem mais viver como casal.
Muitas mães trazem para si o cuidado com o bebê, deixando o pai de lado nesta relação. Ao invés de ambos desenvolverem um olhar para o mesmo caminho, acabam se afastando, cada um seguindo para um lado. Daí começam os conflitos. O primeiro mês de um bebê em casa é caótico e é natural que seja assim. Se o casal está preparado para entender que isso é parte do processo, fica mais fácil administrar este conflito.
Carla contou que, por fazer parte de uma família com 12 pessoas, a dinâmica era outra. "Havia um tempo em que a chegada de um filho era, em parte mais tranquila por conta da própria constituição familiar", relembra. Era muito comum ter outras pessoas morando na casa: uma tia, os avós, pessoas que ajudavam na criação dessa criança. Hoje normalmente não há mais essa presença e toda ajuda é contratada, o que faz muita diferença. Sem contar que ambos precisam trabalhar. Falta tempo, orientação, apoio aos pais. E nesse caminho encontramos as babás, creches, escolas e diversas atividades oferecidas para as crianças passarem o dia.
Família é o maior desafio da nossa vida, é onde começam os desafios de crescimento. É onde vivemos muitos dos nossos conflitos.
Outro ponto importante ressaltado pela palestrante é que já não se leva em consideração a sabedoria das outras gerações. Pelo contrário, essa experiência é quase sempre desqualificada. "Vejo os avós muitas vezes perdendo seu lugar de importância na vida dos netos", conclui.
Carla explicou que até pouco tempo atrás, a criança nascia no meio de uma grande família e havia uma comunidade que apoiava o casal. Hoje, as famílias são nucleares e falta apoio e referência. O tempo de gestação traz uma grande transformação para a vida da mulher a da família. O período desta "crise" acaba ficando muito guardado dentro das mulheres.
Muitas vezes, a mulher pensa de um jeito e o homem pensa de outro jeito e aí começam os conflitos em relação à família que está sendo inaugurada. A busca do ponto de equilíbrio será uma construção para "inaugurar" esta família.
" É incrível como sai uma pessoa de dentro de você e você tem medo de cuidar dela, pois não sabe se comunicar com ela e o parceiro, muitas vezes também não sabe como lidar com esta situação", comentou Carla. Por isso é muito importante oferecer um apoio aos casais grávidos. Além de cursos e aspectos materiais, ter um acompanhamento. Esta é a essência deste projeto.
Família / Mosaico
Carla comparou a família à figura de linguagem de um mosaico. "A gravidez inicia a família, como num mosaico, onde se coloca pecinha por pecinha, formando um desenho maravilhoso e único."
Explicou que mosaico é palavra de origem grega que significa "obra das musas", que busca durabilidade e beleza singular. Nós também queremos durabilidade e beleza na nossa família. E a obra vai sendo construída, peça por peça, dia após dia. Mesmo quando há algum tipo de perda ou partida (seja dos pais ou dos filhos) a construção segue seu caminho.
Além disso, este mosaico representa também as gerações anteriores, que são responsáveis pelo que somos hoje.
Hoje estamos nos afastando muito deste mosaico familiar e com a pandemia o afastamento tornou-se ainda maior. No início, casais com filhos tiveram uma proximidade forçada e, aqueles que conseguiram se equilibrar nesta relação, puderam aprender a conviver em família, coisa que não conseguiam com êxito na correria frenética que vinham vivendo até então.
A pandemia e a relação familiar
Se a gravidez já é um processo difícil, podemos olhar esse momento por diversos ângulos: para alguns casais grávidos, o medo de enfrentar a vida pode motivar mais parceria; para outros, a separação.
Vamos começar olhando para os desafios de se engravidar nessa pandemia. Aliás, por conta da frequência de relações sexuais no período de isolamento, aumentou muito o número de gestações, planejadas ou não.
O fato é que nesse período de pandemia estamos vivendo sob a nuvem do medo, das perdas, das mudanças que sempre geram muita ansiedade. Os grávidos não estão podendo compartilhar, estão tendo seus filhos sem o apoio das famílias. E têm de assumir tudo, em torno da gravidez, parto, puerpério etc.
A pandemia "trancou " a família em casa, intensificando a relação e expondo os lados positivos e negativos da convivência. "As pessoas estão sendo convocadas a olhar para o desconforto e encontrar outras soluções".
Para compreender com mais profundidade os atuais impactos da pandemia no relacionamento familiar, vem realizando há alguns meses a pesquisa “FALA FAMÍLIA”, a partir de entrevistas com os adultos e crianças sobre o que está sendo mais difícil/desafiador, e o que estão aprendendo nesse período.
Com base nas entrevistas já feitas e analisadas, destaca alguns pontos que estamos vivendo em decorrência da pandemia e do confinamento:
Convivência intensa
Aprendendo a lidar com tanta mudança
Medo, pânico, incertezas
Crise nos relacionamentos
Casa como escritório, academia, escola, salão
Distância dos familiares, saudade
Aumento constante das mortes
Familiares doentes, internados
Aqueles que foram sepultados sem a presença da família.
"De repente o mundo parou e ninguém acreditou que fosse parar dessa forma, e por tanto tempo. É humano o sentimento de que não é comigo, não é no meu país, na minha cidade, na minha família. Mas o coronavírus derruba essa maneira de pensar e nos traz a consciência de unidade. Acredito que o maior desafio está acontecendo nas relações de forma profunda, de cada pessoa consigo mesma e com o outro", complementa.
Carla Suzarte: "meu olhar para a família é o mais respeitoso possível e minhas colocações são um convite à reflexão e não uma crítica ou um julgamento. Meu objetivo é plantar uma semente de saúde nas famílias com base no respeito, na comunicação e busca do equilíbrio na relação familiar.
Cada família tem seu jeito
Cada família funciona de um jeito. A questão que a palestrante ressalta é que cada um deve ter seu lugar definido na dinâmica familiar. A pergunta deveria ser: por que eu quero ter um filho? se não se pensa nisso, as consequências chegam e muitas situações acabam desestruturando ou contaminando a família, gerando relações tóxicas entre seus membros.
Continuou explicando que, quando um casal se separa, se não houver este olhar de respeito, os filhos acabam "se perdendo" desta família, muitas vezes perdidos em meio a raivas e desqualificações geradas pelos pais, que geram angústias na formação destes filhos. Por isso, família é coisa séria, que precisa buscar a cura dentro de si para se reinventar e reestruturar-se sempre que necessário, visando a harmonia.
Viver é difícil. Viver num relacionamento familiar é mais difícil ainda, mas também é uma fonte de reabastecimento para cada um buscar ser melhor para si, para o outro e para a família como um todo.
Quando uma criança apresenta um problema, o problema é da família, de todo o sistema. Não se deve "culpar" os pais, mas apoiá-los. Muitas vezes uma das crianças não está bem porque seus pais não estão bem e isso está "vazando" na criança e refletindo nela. Muitas crianças se responsabilizam pelos problemas dos pais, pois podem estar angustiadas com a relação conflituosa dos pais. Daí na escola a criança não aprende, ou não consegue se relacionar com os amiguinhos... o problema não está na criança em si, mas na família - o ideal seria conversar com a família para que ela recebesse um apoio (não crítica, nem culpa, nem recriminação).
De toda essa crise, é preciso nascer uma NOVA FAMÍLIA, aquela que vai em busca da sua potência, dos seus valores, da sua força, do que é necessário para colocar as relações em ordem.
Desconforto estimulando a mudança.
Resgate da conversa, do respeito, do ouvir e ser ouvido.
Olhar para a família como uma empresa, onde cada um tem o seu lugar, promovendo semanalmente reuniões para acompanhar o crescimento, os impedimentos e as novas ações que devem ser implementadas.
A família precisa se reinventar, se reorganizar, ocupar novos papéis, novos cargos.
Podemos ter ajuda, mas precisamos assumir o nosso lugar, sem tanta interferência dos funcionários em casa.
Maior pertencimento.
Buscar a cura dentro de nós e da nossa família.
O que fazer com as crianças? Olhar, ouvir, ler suas necessidades. Elas precisam gastar e produzir energia.
Concluiu convidando os participantes a investir na família, convidando os membros para conversas frequentes, estabelecendo um dia / horário fixo para que a família se reúna e todos possam expor seus conflitos, com base no respeito e no acolhimento.
Esta live pode ser vista no instagram:
https://www.instagram.com/p/COTY_rdFlRp/
Contato com a Palestrante Carla Suzarte:
INSTAGRAM - https://www.instagram.com/carla.suzarte/
SITE - https://www.carlasuzarte.com.br/
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